We do logos?

Quando o mar recua muito e parte do leito próxima à costa aparece, pode apostar, vem tsunami por aí. Há alguns dias, um diálogo da novela Insensato Coração, da rede Globo, ganhou destaque fora do horário nobre. Na ocasião, André Gurgel, personagem de Lázaro Ramos que incorpora um premiado designer, recebe uma reclamação: O seu estagiário havia errado a porcentagem do magenta na "logomarca" de um cliente. Muita gente riu, muita gente brigou pelo uso de termos técnicos julgados como indevidos, mas ninguém percebeu que estávamos diante das águas indo em direção a elas mesmas. Era o anúncio de que algo estaria à caminho. E foi ontem que a onda chegou, inundando a nossa timeline e alcançando rapidamente os TTBr.

O maremoto veio em forma de uma matéria publicada na Globo News. Dessa vez, o problema era muito mais grave que uma discussão semântica. Uma empresa, a We do Logos, é anunciada como revolucionária por causa de um sistema que permite ao cliente escolher o quanto pagar pela sua marca. Tudo acontece por meio do que chamam de "concorrência criativa", em que são enviadas diversas propostas – que provavelmente terminam em .cdr – para que a escolhida suba ao trono e receba uma coroa, um prêmio a partir de R$ 195,00.

Essa filosofia do "quer pagar quanto?" foi mais que suficiente para suscitar a ira de profissionais da área e fazer a hashtah #porraglobonews ir além do Twitter e aparecer na mídia especializada. Também ficamos insatisfeitos e muito chateados, afinal, iniciativas como essa diminuem a importância do design, do processo de aprendizado. O tempo na faculdade, em cursos de especialização, o investimento intelectual e financeiro em livros, entre outros materiais, são nivelados ao piso daqueles que, como a própria repórter cita, "são feras no computador". Lembrando que besta também pode ser um sinônimo para fera.

Acreditamos que uma matéria desse tipo só é divulgada porque não há conhecimento do que seja a profissão designer. Preço muito abaixo do mercado, tantas vezes, é visto de modo duvidoso e associado à qualidade ruim. Se é assim em quase todas as áreas, por que com a gente é diferente? Novamente retornamos ao ponto de partida do parágrafo: As pessoas não sabem o que é design.

Devemos aproveitar o momento e toda essa discussão para mostrar as verdades da profissão e sua importância na comunicação, como funciona um processo criativo e como isso interfere no produto final. Não são apenas riscos e traços aleatórios combinados com letras bonitinhas. Para tanto, muitos precisam descer do pedestal de gênios criativos. Deixar a vaidade de lado e não considerar um atestado de burrice ou uma ofensa indigna de resposta quando alguém perguntar o que fazemos ou como fazemos. Estudar, pesquisar, saber no que está metido. Somar ao invés de dividir ou criticar destrutivamente o trabalho/projeto do coleguinha pelas costas.

Pode ser que o caminho para a mudança comece internamente. Não é uma tarefa fácil, mas estamos acostumados às dificuldades, afinal, afirmamos, mais do que nunca, que trabalhar com design de verdade não é algo simplório.